Carmen da Silva, uma rio-grandina precursora do feminismo brasileiro.

O que pensava Carmen da Silva sobre o aborto?
16 de julho de 2024
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O que pensava Carmen da Silva sobre o aborto?

* A introdução e a contextualização sobre o tema, apresentada (s) a seguir, foram elaboradas pelo redator deste site.

No Brasil, o aborto é autorizado por lei (e deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde - SUS) em três situações específicas: em caso de gravidez resultante de estupro; quando oferece risco à gestante ou se diagnosticada anencefalia do feto, ou seja, a má formação do cérebro durante a fase embrionária ocorrida entre a terceira e a quarta fase de gestação.

Embora seja um direito garantido às mulheres há mais de oito décadas e, nos casos citados acima, chancelados pelo Código Penal Brasileiro, desde o ano de 1940, ainda são muitos os empecilhos burocráticos para o cumprimento da legislação no país. Menos de 5% dos municípios brasileiros, por exemplo, possuem um serviço de abortamento legal. Pior, ainda, são os estigmas e os preconceitos enfrentados pelas mulheres que necessitam deste procedimento de saúde, que viajam milhares de quilômetros sem a garantia do atendimento. Questões que aguçam opiniões e debates, tais como o direito ao corpo e o direito reprodutivo das mulheres.

O contexto adverso salientado anteriormente consolidou o aborto inseguro como uma das maiores causas de mortalidade materna no Brasil. Somente no ano de 2021, quase a metade das mulheres brasileiras (43%) que optaram por esse recurso naquele ano precisaram ser internadas. Dados da Pesquisa Nacional do Aborto (PNA), publicada no mesmo ano, reafirmam esse problema social: a cada 2 dias uma mulher morre por aborto inseguro no país. Na sua maioria, mulheres negras, indígenas e pobres.

Segundo a mesma pesquisa, realizada pela antropóloga Débora Diniz e pelo sociólogo Marcelo Medeiros, ambos da Universidade de Brasília (UnB), 1 em cada 7 mulheres já realizou um aborto até os 40 anos de idade. Embora seja uma ação tão comum na vida das mulheres, tal qual salientam os dados e as pesquisas científicas, o aborto ainda é considerado um tabu na sociedade brasileira, especialmente, nos segmentos mais conservadores.

Assinado por 32 deputados brasileiros, um projeto de lei busca equiparar qualquer aborto realizado no país após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio. A autoria do PL 1904-2024 é de Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). O projeto põe em xeque não apenas os direitos adquiridos em outras décadas, mas a saúde das mulheres e meninas.

Considerada uma das precursoras do feminismo brasileiro, Carmen da Silva abordou esse e outros temas relacionados aos direitos das mulheres em palestras, congressos e em publicações impressas, entre elas na revista Claudia, ao longo da sua vida.

Leia, na sequência, o artigo escrito pela autora:

 

 

Sobre o aborto, por Carmen da Silva

Não podemos permanecer à margem de um debate que ora ocupa o primeiro plano nos meios de comunicação e inflama a opinião pública. Um tema já discutido e resolvido em muitíssimos países e que, cada tanto ressurge no Brasil: a questão da interrupção voluntária da gravidez, a polêmica em torno da legalização, ou não, do aborto.

Nossa opinião seria tanto mais chamativa porque, a estas alturas, já meio mundo opinou a respeito: autoridades governamentais, membros do clero, associações religiosas e civis, médicos, sociólogos e até, surpreendentemente, câmaras municipais de várias cidades do Brasil.

Ora, se o assunto interessa tanto a cavalheiros, entidades e instituições que, afinal de contas só o podem encarar de modo teórico, abstrato, com mais razão deve interessar às mulheres – únicas que engravidam, as únicas que podem viver o problema íntimo e, concretamente, na própria carne.

A matéria é ingrata e sua abordagem parece forçar um tom apologético. Sempre se tem de começar por explicar o óbvio: não, o aborto não é um meio de controle de natalidade, e sim, um último recurso quando a concepção falhou. O aborto não é desejável em si; pelo contrário, é violento e traumatizante. Aliás, como toda e qualquer intervenção cirúrgica. Só que nenhum cirurgião se sente obrigado a desculpar-se pela brutalidade implícita em certos recursos e técnicas: cortar, serrar, extirpar, amputar, mutilar.

Prevejo a objeção: o cirurgião opera enfermos e gravidez não é doença. Continuamos no óbvio – e reservo alguma ressalva para mais adiante. Por ora, só quero afirmar que, como todo mundo, acho o aborto um mal, exceto, é claro, para os que dele fazem uma redondíssima indústria. Dizer-se a favor do aborto é uma imprecisão de linguagem, o que se deve dizer é que se é a favor de sua discriminação. Aborto pertence ao rol dos “crimes legais”, isto é, “Criação oficial ou ideológica, sem bases reais nos sentimentos sociais” (A. Gomes Neto). Como o consumo de carne vacum na Índia, o drinque nos países de religião islâmica, a poligamia nas sociedades ocidentais (mas bota aí muita ironia...). E ao aceitar esses primeiros exemplos que me vêm à mente, noto que todos eles expressam tabus religiosos, respeitabilíssimos para os respectivos adeptos, mas que deveriam exercer coação sobre toda a sociedade nos países em que o Estado e religião são separados.

Um dos argumentos mais frequentes contra o aborto é a imputação de assassinato, acrescida do apelo sentimental que vem da conotação de covardia: mata-se, por assim dizer, “pelas costas”, um embrião inocente que não pediu para nascer e está indefeso ante o ataque.

Ora, pedir para nascer ninguém jamais pediu. Esta é uma característica comum a todos os seres vivos na face da terra: ninguém escolhe o início da própria vida, ninguém opta por começar a viver ou não; todas as opções vêm depois.  Enquanto não há pelo menos um rudimento de consciência, não há nenhum tipo de escolha. Assim como não há uma sensibilidade subjetiva (não confundir com excitabilidade nervosa ou reação reflexa), não há uma criatura que deseja a vida, que se apega a ela, que percebe uma ameaça de morte e se angustia e sofre. O embrião não se sente, não se pensa e seria tolo atribuir-lhe sentimentos e reações que, na realidade, são nossos. É nossa consciência, nossa própria subjetividade que vê no embrião abortado uma promessa não cumprida, uma potencialidade não realizada, o malogro de algo que poderia ter sido vida.

Seja como for, independente da ideia de escolha, uma vez que existe vida, ela tem de ser respeitada. Este é o argumento irrebatível, o “valor mais alto”. É o caso, pois, de determinar com precisão em que momento a vida começa.

Reportemo-nos à França, 1972. Um clamoroso processo envolve três operárias: Marie Claire, de 18 anos, abortou; sua mãe consentiu e ajudou, uma colega de sua mãe praticou a intervenção. Assim como não haviam podido pagar um médico, também não tinham dinheiro para o advogado. A jurista Gisèle Halini assumiu a defesa e começou por colocar a pergunta: o zigoto – ou seja, a primeira célula diferenciada produzida pela fusão do óvulo com o espermatozoide – é já uma vida? Ou apenas uma perspectiva de vida?

Em nome da Igreja, Santo Thomás já respondera, setecentos anos antes: o feto do sexo masculino possuiria uma alma aos quarenta dias da gestação, o do sexo feminino só começaria a tê-la depois de oitenta dias. Preferindo o enfoque científico, Halimi arrolou o testemunho de destacadas personalidades, inclusive, os Prêmios Nobel de Medicina. Um deles, o professor Jacques Monod, disse: “A vida não começa nunca. Não há um momento privilegiado, uma etapa decisiva conferindo, de repente, a dignidade de pessoa; há uma evolução progressiva, uma série ininterrupta de reações e sínteses que vão pouco a pouco modelando a futura criança”.

Ora, neste caso, a vida já estaria contida no espermatozoide isolado, no óvulo isolado. A vida de hoje já estava implícita há séculos, milênios, bilhões e trilhões de anos, assim como a vida do mais remoto futuro que possamos prever já se delineia na célula de hoje. E, neste caso, a própria abstinência sexual já seria um atentado à vida?

É um pouco estonteante – e por demais fluido para servir como base de raciocínio. Assim, Halimi propõe partir de dados mais precisos: em que momento o feto conquista o mínimo de autonomia que lhe permitirá sobreviver separado do corpo materno?

Segundo os especialistas, nunca antes de 24 semanas; muitos estendem o prazo a 27/28 semanas. Até lá, conclui Halimi, se o feto fosse expulso, de modo provocado ou natural, enquanto não tivesse qualquer possibilidade de vida fora de meu próprio corpo, eu certamente consideraria que houve um potencial de vida humana que não se concretizou; mas esclarecendo logo que ele não o poderia fazer fora de mim, que não era senão um prolongamento de meu corpo e, portanto, tratava-se de algo estritamente meu, de uma questão de mim comigo. Equiparar esse aborto a homicídio é levar as coisas longe demais.

Frisa a advogada que a lei francesa só passa a presumir a existência de uma criança depois que o feto tem 180 dias; até lá, ela não tem vida civil, não é sujeito de direito – enfim, não é um ser humano. Segundo o jurista brasileiro Nilo Batista, o debate jurídico sobre o início da vida do feto vem-se espichando há 150 anos e até agora não se chegou a nenhuma conclusão: juiz que decide sobre a matéria, fá-lo a partir da própria opinião, pois não há doutrina formada nem jurisprudência a respeito.

Até aqui, usamos uma linguagem tipicamente masculina: fatos, teorias, abstrações, abordados com distanciamento e frieza. Aliás, uma linguagem que teve de falar Halimi ante um tribunal composto só de homens. Inclusive, num momento dado, o juiz perguntou à depoente: “Espéculo: A senhora o colocou onde, na boca?” E são eles que decidem sobre a concepção, a gestação, a gravidez, o aborto, a maternidade, os temas ligados a nossa carne, a nosso sangue, a nossos mais entranhados sentimentos.

Cabe aqui a história de Carla, garota de 18 anos de uma humilde família do Sul da Itália. Também ela foi engabelada com uma “visita aos pais” do namorado, que estava sozinho e violentou-a com tal brutalidade que ela nunca mais o quis ver. Exatamente como Marie-Claire. Só que Carla, não podendo contar com o apoio e a compreensão dos seus, teve de se arranjar sem ajuda.

Algum tempo depois, alta madrugada, sua mãe vai encontrá-la esvaindo-se em sangue no banheiro. Acuada, Carla confessa uma tentativa de aborto malsucedida. Com todas as precauções para não acordar o pai, que “se chegasse a saber, mataria a filha”, a mãe leva a jovem ao hospital. Uma curetagem teria sustado rapidamente a hemorragia sem maiores problemas. Porém uma equipe médica levou cinco horas lutando para salvar o feto, enquanto a menina, alucinada de pânico e dor, gritava que se mataria, se a obrigassem a ter um filho. Felizmente, e tenho plena consciência do monstruoso paradoxo desta frase, só a vida de Carla pôde ser salva.

É arrepiante a truculência da sociedade, da família, dos indivíduos, contra a mulher, contra seu corpo, sua sexualidade, sua liberdade, seu direito de aceitar ou recusar. É estarrecedora a hipocrisia com que essa violência se disfarça de amor, proteção, defesa dos valores morais, exaltação da vida. Por paixão, o namorado atraiu Carla a uma arapuca e lhe impôs sexo à força. Por amor e zelo, seu pai seria capaz de matá-la. A sociedade paternalista e defensora dos bons costumes selou os lábios da violentada sob pena de expô-la ao opróbrio e à condenação. E se ela tivesse apresentado queixa, a justiça a esmagaria com a incredulidade e o desdém: “Violada pelo namorado? E em casa dele, onde entrou por seus próprios pés? Ora, quem vai engolir essa?. E médicos saíram com a consciência em paz, após lutarem até o fim pelo nobre objetivo da preservação da vida. Uma vida que eles depois jogariam nos braços de Carla – e aí, cada um por si e Deus por todos.

Ser “a favor da vida” é um chavão que acaba não significando nada: afinal de contas, quem não é? Convém, pois, definir o que se entende por vida.Biologicamente, a vida é troca. O organismo vivo mantém constante intercâmbio com o meio, absorvendo e eliminando ar, umidade, nutrição. Essa química assegura a vida vegetativa, mas não basta para o ser humano: para este, o sistema de trocas deve abarcar também o social, o contato interpessoal. A existência humana é uma inter-relação, um estar com o outro, medir-se, reconhecer-se e diferenciar-se a partir do outro, permutar com o outro afeto e satisfação das necessidades. O ser humano só vive na medida em que convive.

Assim, o filho desejado é ainda uma promessa, um embrião menor que um grão de arroz, e já os sentimentos da mãe o envolvem num ninho de amor que lhe outorga uma dimensão de vida.

E o bebê indesejado? Este é sentido como uma doença, a invasão de um corpo estranho. Mais ameaçador que um tumor, por seu crescimento constante e inexorável, pela certeza de que não há como escapar da data em que ele surgirá para ocupar um espaço físico no mundo onde não lhe foi reservado um espaço emocional. Nada mais apavorante – sobretudo tratando-se de jovens que engravidam por inexperiência, sem marido e morrendo de medo da reação da família – do que a sensação de absoluta impotência ante essa presença hostil, crescendo e crescendo a cada dia em seu ventre.

E esse bebê vai nascer. Frágil, vulnerável, sua sobrevivência física e psíquica exigirá cuidados, estímulo, carinho. Amor será seu principal alimento. Bebês criados em instituições onde materialmente não lhes falta nada, mas onde carecem de vínculos humanos pessoais cálidos, atrasam-se no desenvolvimento, caem em estado de prostração, alguns até morrem.

Não quero mencionar aqui circunstâncias extremas, embora, infelizmente, comuns no Brasil: miséria, comida escassa, falta de recursos médicos, crianças entregues a si mesmas por não terem quem se ocupe delas. Mesmo nos lares onde haja ótimas condições econômicas e culturais e um sólido senso de responsabilidade, o bebê não desejado encontraria, no melhor dos casos, cuidados escrupulosos, proteção ansiosa, um amor ambivalente, feito de má consciência e supercompensação. Desastres ocasionais, atos falhos – sabão nos olhos, uma espetada com o alfinete na fralda, se não algo pior – dariam vazão aos sentimentos negativos reprimidos.

Só que a boa vontade não substitui o amor genuíno. E o consciencioso esforço materno não basta para enganar o bebê, para aplacar sua fome emocional, que ficará insatisfeita, fonte permanente de insegurança, ansiedade, agressão, um agudo sentimento de culpa, depressão. As futuras consequências negativas de tão pesada herança são imprevisíveis.

Uma coisa, porém, é certa: posto que vida é também intercâmbio afetivo, ele já nasce condenado a uma subvida, a uma meia-vida, a uma existência dolorosamente incompleta.

E para dar uma criatura esse duvidoso “presente”, impede-se uma mulher de exercer seu legítimo direito de opção, submetendo-a à “ditadura do corpo” (J. Pitanguy R.), que, na realidade, não é só do corpo: durante os próximos anos, seu tempo, seus projetos, sua auto-realização, seu desenvolvimento intelectual, profissional e humano, seu trabalho, seu descanso, suas horas de sono, seu convívio com amigos, sua intimidade com o companheiro, suas necessidades, enfim, tudo o que é dela, tudo o que é ela, terá de se subordinar às necessidades do filho. Exigência árdua, mas gratificante para quem a escolheu, violência inominável quando imposta a quem não a desejou. E sacrifício parcialmente inútil, pois a falta de amor genuíno neutralizará seus efeitos.

Há algo muito errado quando o “respeito” à vida potencial se traduz na agressão contra vida existente. “Em nome de quê (diz um documento das feministas cariocas) se defende a vida do embrião, vegetativa e abstrata, deixando em segundo plano a vida da criança real e da mulher?”

Da mulher que aborta ou tenta, as pessoas costumam ter uma péssima imagem: ela seria egoísta, cínica, ávida de prazeres e destituída de qualquer sentimento maternal. Mas a reprovação social e o veto legal cessam, se ela provar que sua gravidez provém de estupro.

E aqui põe-se a nu a hipocrisia básica da “defesa da vida”. Pois, se basta o fato físico da concepção para considerar-se que já existe uma vida a ser preservada, não cabe distinção nenhuma: vida é vida, seja qual for a intenção, o animus que lhe deu origem. Concebida há dez semanas, oito meses ou vários anos, gerada no amor, na indiferença, no descuido, na violência, não importa: se há vida e é crime eliminá-la, estabelecer hierarquia é criar um artifício. Entretanto, o estupro é o único caso em que a lei admite a soberania da mulher grávida sobre seu ventre, e o feto pode ser sacrificado sem que protestem os defensores da vida. A permissão de aborto seria uma espécie de prêmio ao bom comportamento, concedido àquela que puder provar que o sexo lhe foi imposto pela força, isto é, que não exerceu sua sexualidade livremente e com prazer.

Eis o núcleo da questão: desculpabilizar o aborto é admitir em concreto – e não só da boca para fora , como fazem os pseudoliberais e os “feministóides” – o direito da mulher a uma sexualidade livre. Ocasionalmente destinada à procriação, mas sempre destinada ao prazer. O corpo feminino tomado a serviço da espécie pertence à sociedade, ao homem que o custodia em nome da sociedade; desligado da servidão, esse corpo passaria a pertencer a sua dona, tornar-se-ia um aliado da liberdade dela e não mais um instrumento de opressão.

Ora, a libertação sexual da mulher viria recolocar em pauta uma série de questões nas quais o sistema prefere não mexer: a família monogâmica e patriarcal, as relações entre os sexos, os papéis sexuais, a exploração do trabalho feminino, doméstico ou fora do lar, enfim, a própria estrutura da sociedade. Daí as intensas resistências que o tema provoca e o firme propósito de deixar tudo como está.

Condições econômicas viáveis para todos, educação sexual, acesso a uma contracepção segura, barata e inócua, são elementos vantajosos sob todos os aspectos e que viriam, também, reduzir drasticamente o atual número de abortos (dois milhões por ano, segundo as estatísticas, mas ninguém explica como se faz para computar uma atividade ilegal e, portanto, clandestina). Mas não substituiriam a liberdade de aborto.

Uma jovem senhora de minha família, ao dar à luz o terceiro filho, fez ligar as trompas. Doze meses mais tarde e em condições particularmente difíceis – o casal recém-transferido para uma cidadezinha estranha, de poucos recursos, longe da família de ambos, a desambientação, uma criancinha de um ano solicitando cuidados e atenção – nascia o quarto bebê. O médico responsável (ou irresponsável?) pela ligação de trompas disse que “sentia muito”. A jovem mãe não recorreu ao aborto por objeções de consciência.

Dela própria: as únicas que são válidas nas circunstâncias. Não sei se também as teria, caso o aborto não fosse considerado crime; só sei que está galhardamente tratando de ser a melhor mãe possível.

Contudo, sem necessidade de invocar situações extremas, parece muito abusivo, muito opressor, privar a mulher do domínio e da livre decisão sobre a única propriedade intrínseca e indiscutível de qualquer ser humano: seu corpo.

Referência

SILVA, Carmen da. Sobre o aborto. In: CIVITA, Laura Taves (org.). O melhor de Carmen da Silva: coletânea de artigos publicados ao longo de 22 anos na revista Claudia. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1994. p. 229-235.